Podcast “Deu ruim, mas aprendi”- Episódio 2: Feedback Negativo

Uma pergunta: Quem já participou de qualquer workshop ou treinamento, já parou pra pensar o que acontece depois que todo mundo se despede? Pois é… ficam os facilitadores catando papel das mesas e do chão, copinho de café, tentando achar todas as tampas das canetas que ficaram largadas nas mesas, recolhendo o material. Já tive até que arrastar mesa e cadeira porque a sala tinha que ser arrumada no seu formato original e não havia mais ninguém pra fazer isso por mim. Eu, particularmente, além de fazer tudo isso, dou uma sentada – porque a essa altura, minhas pernas e pés já estão pedindo socorro – e paro pra ler os resultados A AVALIAÇÃO DE REAÇÃO.

Isso aí… aquele formulário que quem preenche acha que nunca vai ser lido. Vai sim. E aqui vai uma informação que vocês podem até saber, mas a avaliação de reação é o primeiro nível de avaliação da eficácia de um treinamento. Ele avalia itens como a didática dos facilitadores, os materiais, a gestão da logística, relevância do tema, enfim, a percepção dos participantes sobre o curso do qual eles acabaram de participar.Existem mais três níveis, que são: aprendizado, comportamento e resultados. Esse modelo é do Kirkpatrick e é amplamente utilizado por profissionais da área de Aprendizagem. Vou colocar um link sobre isso ao final deste artigo, pra quem quiser saber mais.

Voltando: eu estava lendo as avaliações de reações contando que iria encontrar os já esperados elogios quando, de repente, me deparei com uma avaliação cujas notas estavam quase todas lá embaixo.

Eu passei por todos os estágios da SARAH. Pra quem não conhece, SARAH (S-A-R-A-H) é um acrônimo que apresenta os 5 estágios pelos quais passamos quando recebemos uma notícia que não nos agrada. Esse modelo também é utilizado pra explicar o processo de gestão de mudança. As letras são para termos em inglês: S de Shock, A de Anger (ou raiva), R de (Resistance) Resistência , A de (Acceptance) Aceitação e H de Hope (ou esperança). Mais informações no link abaixo.

Quando eu olhei para aquele pedaço de papel, me deu uma sensação muito ruim. Momento “Shock”: como assim, não gostou? Todo mundo gosta desse workshop! Aí veio a raiva, quando eu li que a pessoa assinou. Ana… Ah, eu sei de onde essa pessoa é. Todo mundo dessa área é super crítico”. A resistência chegou na sua mais patética representação: “Será que ela confundiu e achou que 5 era muito ruim e 1 era muito bom?”. Só no dia seguinte, chegou a aceitação: Peraí. A pessoa assinou. Então, ela não vai se incomodar se eu for falar com ela pra entender a avaliação que ela fez do curso. E, finalmente, a esperança, que foi quando eu decidi que iria ligar pra ela e marcar uma reunião.

E foi a melhor coisa que eu poderia ter feito. Engraçado, que eu acho que ela não estava esperando que eu fosse chamá-la, porque quando ela chegou, parecia que estava meio sem graça. Mas eu já tinha passado por todas as minhas etapas do SARAH e, realmente, queria entender o que não havia agradado. E a Ana foi ótima. Ela falou que ela não tinha gostado de duas coisas:

A primeira coisa que ela não gostou foi de uma sessão específica do workshop. “Qual sessão”, eu perguntei? Quando ela explicou, eu lembrei que foi uma parte facilitada por uma pessoa que estava comigo, como co-facilitadora. Ela era menos experiente e eu lembro que achei que ela estava explorando pouco, fazendo poucas perguntas. A Ana foi cirúrgica. Ela achou aquela parte “superficial” e pouco interativa.

“Ok, feedback recebido, vou resolver isso aqui. E qual foi a segunda coisa que você não gostou?” Aí, a Ana começou a falar de um exercício que fazíamos nesse workshop, em que o participante se projetava para o futuro e, a partir dessa projeção, era convidado a tentar tangibilizar essa visão: em que lugar essa pessoa se via? Fazendo o quê? Como? Com que objetivo? Qual o legado dessa ação? É um exercício que alguns coaches usam e é muito poderoso.

A Ana não gostou… porque ela não conseguiu fazer o exercício. Ela se via fazendo muitas coisas, porque tinha diversos interesses e habilidades e fazer aquele exercício trouxe muito desconforto pra ela.  Esse segundo ponto nos levou a uma conversa muito bacana, em que eu acabei sugerindo que ela elaborasse diversos cenários considerando esses interesses e habilidades e que os revisitasse de tempos em tempos para ver se algum deles fazia mais sentido. A moça adorou e, até eu sair da empresa, todas as vezes que nos encontrávamos, ela fazia a maior festa, agradecia pela conversa e tal.

O que eu aprendi? A primeira queixa da Ana fazia sentido. Como eu disse, eu vi que a outra facilitadora estava sendo meio superficial, mas eu não interferi. Achei que, se eu assumisse o controle, iria atropelar a outra pessoa e ela poderia ficar chateada comigo. Mas, como eu era a facilitadora principal do workshop, não podia ter deixado a discussão ficar fraca e não fazer nada na hora só porque eu não queria “magoar” a outra facilitadora….. Já falei isso antes e repito. O objetivo maior de uma ação de aprendizagem é o aprendizado. Se o que está se fazendo não está contribuindo para o aprendizado, algo precisa mudar. Eu chamei a outra pessoa que havia facilitado comigo o workshop e dei o feedback pra ela, mas fiquei com um aprendizado pra mim de que, em outras situações semelhantes, eu iria intervir imediatamente.

Aprendi também uma coisa que tudo quanto é livro de desenvolvimento fala: sobre a importância de receber feedback negativo e saber lidar com ele. Eu já recebi vários, mas esse teve um impacto muito grande, porque foi um ponto fora da curva. Porque, normalmente, as avaliações de reação que recebo dos meus workshops são positivas, então, bateu muito forte em mim. Eu poderia ter simplesmente deixado pra lá, mas eu iria ter perdido a oportunidade de ajudar alguém. Duas pessoas, no caso: a Ana e a co-facilitadora. …. Bom, na verdade três… A mim também

Parece papo de auto-ajuda, mas saber lidar com essas situações pode trazer benefícios no médio-longo prazo. E a gente tem uma dimensão maior disso, quando sente na pele. Eu espero que Ana esteja por aí, seguindo seu caminho e revisitando suas alternativas. Espero também que a pessoa que estava comigo naquele dia também tenha levado um aprendizado pra ela também, porque eu, com certeza, levei.

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